Isabel Ventura

Isabel Ventura é doutoranda em sociologia na Universidade do Minho e mestre em Estudos sobre as Mulheres, pela Universidade Aberta. É Licenciada em jornalismo, pela Universidade de Coimbra. Desenvolve investigação sobre regulação da sexualidade, crimes sexuais e justiça. É autora de As Primeiras Mulheres Repórteres (Tinta da China). É cocoordenadora da rede de investigador@s emergentes da APEM (Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres) e cofundadora da Universidade Feminista.

 



Comunicação

O que é [um] ser humano? Género, interseccionalidade e neutralidade na era da Igualdade.



Resumo

O sexo biológico é uma importante categoria que influencia a perceção que os/as outros/as têm de nós. O seu peso é demonstrado por inúmeros gestos quotidianos que começam mesmo antes do nosso nascimento (assim que se sabe o sexo do/a bebé, a preparação para a sua chegada torna-se azul ou rosa) e se prolonga pela vida fora. Uma das primeiras frases que um/a bebé ouve após nascer – “É um/a menino/a!” – ilustra bem a relevância do sexo biológico na construção identitária.

Após o desenvolvimento das teorias de género, que salientam a importância da socialização na construção da feminilidade e da masculinidade, assistimos à complexificação das categorias que definem os seres humanos e que condicionam a sua vulnerabilidade à violência.

A interseccionalidade emerge assim como um pensamento que reclama que as mulheres - e os homens - não são grupos homogéneos de pessoas e que outras características são – ou podem ser – tão ou mais marcantes quanto o género. Assim, a experiência da gravidez e da maternidade de uma mulher pobre (ou de uma minoria étnica/religiosa/orientação sexual, ou com uma deficiência, entre outras) pode ser profundamente diferente da de uma mulher branca, de classe social alta, e sem necessidades especiais.

Diversos inquéritos aos valores dos/as europeus/eias demonstram que há mais diferenças entre pares do que interpares (uma portuguesa pode ter mais valores comuns a um português do que a uma finlandesa, p.e.). A similitude biológica não parece determinar a semelhança social.

Em simultâneo, os discursos da neutralidade, que advogam uma neutralização do género nas narrativas legais, jornalísticas, etc., têm vindo a ganhar terreno, defendendo que a violência não afeta apenas “mulheres”, mas antes “pessoas”. Contudo, os discursos da reciprocidade (homens e mulheres são afetados/as pela violência ou pela pobreza de forma igual) ignoram a desproporcionalidade de género, que é, inclusivamente, salientada pelas instituições internacionais. Não obstante as mulheres também poderem exercer violência doméstica sobre os homens, os números de mulheres assassinadas pelos seus (ex)companheiros/maridos/namorados revela bem como o problema está longe de ser recíproco.

A neutralidade, tão acarinhada na era da igualdade, apresenta-se como um desafio importante em sociedades com dificuldade em problematizar as diferentes dimensões da violência de género. A tentação pela ultra simplificação pode ter como consequência a obnubilação da génese da violência e, consequentemente, dificultar a sua resolução.

 

 

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